sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Lokabrenna


            Quem é fã de mitologia nórdica, já conhece suas histórias assim como o seu fim. Mas e se elas fossem contadas pela perspectiva de um dos deuses mais populares (ou impopulares) de todo o panteão nórdico? O evangelho de Loki traz esta proposta. Escrito por Joanne M. Harris, foi lançado em inglês em 2014, chegando traduzido no Brasil no ano de 2016. Este livro é considerado uma prequela (acontecimento anterior) dos livros Runas e Luz das Runas, publicadas pela Rocco Jovens Leitores, selo da editora Rocco. Isso deixa as coisas um pouco confusas para quem deseja obter estes livros, pois O evangelho de Loki foi lançado pela Bertrand Brasil, selo da editora Record.

            Querendo contar sua própria versão dos acontecimentos, Loki, o deus da mentira, criou a Lokabrenna, o evangelho de Loki. Assim, ele narra a mitologia nórdica sob sua perspectiva.

            Além de contar a mitologia nórdica na perspectiva de Loki, o livro também faz uma releitura dessas histórias, mudando certas coisas e acrescentando outras. Uma dessas mudanças é a origem de Loki, cujos pais são Farbauti e Laufey, um jotun e uma Aesir respectivamente, e aqui eles são um relâmpago e galhos secos, sendo o Loki um demônio do Caos. Outras diferenças com relação aos mitos são sobre seu filho Fenrir, que aqui é um lobisomem ao invés de um lobo puro, Heimdall ser um Vanir, e não o filho de Odin com outras nove mulheres (não me pergunte como isso é possível) e Angrboda ser descendente do Caos, e não uma jotun.

            Quanto aos acréscimos, além de dar personalidade aos deuses e inventar novas histórias, alguns furos dos contos originais são explicados aqui, como o porquê de Loki usar o manto de falcão de Freia se este tinha a capacidade de mudar de forma e o porquê de Loki matar Balder.

            Com relação aos personagens, como são descritos pelo ponto de vista de Loki, a maioria deles é descrita como babaca, tratando o protagonista como um forasteiro. Apesar de serem personalidades simples, cada um tem a sua como Odin ser um estrategista que guarda segredos dos outros deuses, Freia ser uma deusa que faria de tudo por uma joia, Thor ser o homem forte, mas com pouca inteligência, Balder ser o bonzinho e o queridinho de todos, etc. Creio que o personagem melhor desenvolvido é o próprio Loki, que é o típico deus travesso que nós conhecemos, mas que vive em conflito com relação a ajudar ou trair os Aesir. Dou atenção a personagem Gullveig-Heid, uma deusa Vanir que nunca tinha ouvido falar e tem pouca aparição na mitologia nórdica, enquanto aqui, ela é a vilã principal da história. Foi bom conhecer algo novo dessa mitologia.

            Tenho minhas críticas com relação a narrativa, sendo uma delas a referência de objetos e modas dos tempos atuais numa história que supostamente ocorreu há séculos atrás. Como por exemplo uma jovem possuir um caderno cor de rosa e a menção do termo “bad boy”. Mesmo sendo narrada por Loki, que seria bem capaz de fazer essas referências se vivesse nos dias de hoje, não ficou legal. Também tive dúvida com relação a Loki e sua esposa Sigyn: Pesquisei e descobri que no povo viking, o divórcio era permitido. Se Loki não suportava a esposa, por que não se separava de vez? A autora poderia até ter dado a desculpa de que Loki não fez isso para não atrair a suspeita e a fúria de certos deuses. Acredito que ela não fez isso por não ter pesquisado o suficiente dessa cultura. É claro, isso é apenas uma suspeita minha.

            Esperava mais desse livro. Achei a narrativa um pouco boba, ainda mais com essas referências a atualidade. Tinha uma ou outra coisa que achei criativa, porém, não o suficiente para amar este livro e ler suas sequências. Se tivesse que dar uma nota, daria um seis de dez. Não é ruim, mas não é nada de espetacular. 


 

sexta-feira, 9 de setembro de 2022

O Reino das Fadas


         Voltamos a mais uma obra do autor que é considerado o pai da literatura fantástica, que influenciou autores como J. R. R. Tolkien e C. S. Lewis. Phantastes foi escrito por George MacDonald em 1858, sendo este seu primeiro romance de fantasia.

            Ao completar seus vinte e um anos, Anodos recebeu a chave da escrivaninha do seu pai, que havia falecido muito tempo atrás. Dentro dela, havia uma pequena câmara com uma diminuta mulher dentro. Esta disse que lhe concederia o desejo de visitar o Reino das Fadas.

            Se tivesse que resumir a história em poucas palavras, diria que é um Alice no País das Maravilhas para adultos. Anodos anda passeando e vivendo aventuras estranhas no Reino das Fadas do mesmo jeito que Alice faz no País das Maravilhas, ambos conhecendo o local em que estão ao longo de sua caminhada. Mas diria que os acontecimentos de Alice no País das Maravilhas são mais nonsense enquanto Phantastes é uma fantasia que pode ter uma mensagem ou uma interpretação por trás, como a sombra que persegue Anodos, que pode representar o seu pessimismo, a sua depressão etc.

            Quanto aos seres mágicos que são apresentados neste livro, há fadas que são descritas como pequenas, podendo mudar de expressão em menos de um minuto, o que me lembram as fadas do livro do Peter Pan, que mudam de humor rapidamente. Os gnomos e as fadas-duendes, que de acordo com o protagonista, que é também o narrador da história, normalmente habitam o chão e plantas trepadeiras terrestres. Há também certas árvores com características humanas, como se fossem hamadríades (ninfas das árvores), só que com versões masculinas além das femininas. Uma delas é o freixo, que persegue o protagonista durante um tempo. Será que foi deste livro que a autora de Corte de Espinhos e Rosas tirou a ideia de usar a madeira do freixo como fraqueza dos feéricos? Também há aparição de gigantes e um dragão na obra.

            O livro faz referência a outras duas histórias: Uma é a de Pigmaleão, o homem da mitologia grega que se apaixonou por uma estátua. A segunda é de Sir Percival das lendas arturianas.

            Algo que acho interessante de mencionar é quando Anodos chega a um castelo encantado e consegue entrar dentro da história dos livros que lê (como acontece com a maioria dos leitores, só que de forma literal). Ele detalha duas delas: Uma sobre um mundo parecido, mas ao mesmo tempo diferente do nosso, em que as mulheres tinham asas ao invés de braços e aparentemente, quando as pessoas morrem, elas renascem no nosso mundo. Isso me fez perguntar se George MacDonald acreditava em reencarnação. Que ele era pelo menos um pouco religioso ele era, pois dá para perceber isso sutilmente enquanto lê a obra. A segunda história é sobre um homem que compra um espelho encantado com uma mulher dentro. Acho que esta última merecia ser um conto próprio. Gostei bastante dela.

            O lado negativo é que o livro é muito descritivo, algo comum na literatura da época, e há momentos bastante filosóficos, o que pode ser um tanto cansativo para o leitor que não está acostumado. Mas recomendo para aqueles que desejem conhecer o livro que praticamente fundou a literatura fantástica moderna. Venha para o Reino das Fadas. Só tome cuidado para o freixo não te pegar.