sexta-feira, 18 de abril de 2025

Obras do Fradinho da Mão Furada


            Muito do folclore brasileiro foi inspirado nas crenças portuguesas, junto com as indígenas e africanas. Porém, nunca havia lido uma história que se baseasse em um ser folclórico de Portugal. Até agora... Obras do Fradinho da Mão Furada é um texto de autoria desconhecida, mas que foi atribuído ao escritor e dramaturgo António José da Silva, nascido no Brasil Colônia.

            André Peralta é um soldado pobre que arrumou uma casa abandonada como refúgio da chuva. Mas descobriu que ela não era tão abandonada assim, pois um demônio era o seu proprietário. Este tinha uma aparência horrenda e se vestia de frade apesar de sua natureza demoníaca. Ele era o Fradinho da Mão Furada, um dos servos de Lúcifer que faz pacto com os humanos. Este oferece um acordo com André Peralta. Será que o homem vai aceitar?

            O Fradinho da Mão Furada ou o Diabinho da Mão Furada, que pode ser considerado tanto o antagonista e guia do protagonista é baseado no ser do folclore português de mesmo nome. É dito que ele ajuda uma pessoa a encontrar riquezas, mas isso é apenas uma enganação para tentá-la e levar sua alma para o inferno. Também gosta de fazer travessuras o que me lembrou a figura do Saci, só que mais maligna. Aqui no livro, o personagem é bem fiel as descrições. Ele obriga o protagonista a aceitar sua companhia enquanto em sua jornada mostra lugares associados ao inferno, que a gente não sabe se é real ou apenas uma ilusão feita pelo diabinho, enquanto Peralta resiste firmemente as tentações, pois é um soldado honrado e leal a Deus.

            Falando nesses lugares, neles o protagonista se depara com figuras da mitologia greco-romana como Proserpina (Perséfone na mitologia grega), Eurídice, Cérbero e o Rei Midas. Também teve o rei Saul, figura bíblica que invejava os feitos de Davi. Houve também a personificação dos sete pecados capitais e palavras como a Cobiça, o Engano, a Mentira e a Verdade. Estas duas últimas me lembrou uma história: um dia, a Mentira engana a Verdade e rouba suas roupas e se passa por ela, enganando todo mundo. A Verdade apareceu para desmenti-la, mas como estava nua, todos ficaram chocados e ela desapareceu, envergonhada. Aqui no livro, a Verdade aparece nua e não sente vergonha enquanto a Mentira aparece bem adornada. O fradinho comenta que ninguém dá crédito aos sinceros e malvestidos. E toda mentira costuma ser bem detalhada e cresce ainda mais com o ego do mentiroso, por isso sua personificação é bem-vestida. Gostei dessa associação.

            Agora para os pontos negativos. Como a linguagem é do tempo do Brasil colonial, tinha coisas que achei difíceis de entender e isso dificultou um pouco a leitura do texto. Algo que não é bem um ponto negativo, mas sim algo curioso, é que quando Peralta esteve no inferno, várias pessoas estavam sendo punidas de acordo com suas profissões em vida. E lá, estavam os poetas sendo punidos por compararem obras humanas à divinas. Tenho a impressão de que o autor do texto, assim como Platão, não gostava muito dos poetas. Para mim, isso foi excessivo, mas cômico.

            Um assunto que acho interessante de destacar é a discussão entre o diabinho e Peralta em que o primeiro diz que a humanidade nem precisa de muita interferência dos demônios para serem maus. Enquanto o segundo diz que ainda assim, existem almas boas que se arrependem, como aconteceu com alguns dos fiéis santos de Deus. O fradinho replica que isso era antigamente e hoje não se tem essa esperança. E vocês? Acham que ainda há chance de uma pessoa má se arrepender e se redimir nos tempos atuais?

            De maneira geral, gostei da história. Espero que encontre outros livros que falem sobre figuras folclóricas de Portugal, pois quase não encontro. E se quiserem dar uma lida, podem vir. Só tomem cuidado para não encontrarem o Fradinho da Mão Furada. Se livrar dele vai ser difícil.


 

Nenhum comentário:

Postar um comentário