sexta-feira, 13 de junho de 2025

Os Melhores Contos de Fadas Nórdicos

 


        Já li contos de fadas de vários lugares, por que não leria das terras dos vikings? Os Melhores Contos de Fadas Nórdicos é uma coletânea de vários autores e, como faço na maioria desses livros, analisarei uma história de cada vez e no final darei meu veredito. Comecemos:

A Leste do Sol e Oeste da Lua – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Um pai vivia com sua família e diversos filhos, sem dinheiro para alimentá-los nem vesti-los. Numa quinta-feira de outono à noite, com um clima horrível lá fora, um enorme urso branco bateu em sua janela, oferecendo riquezas em troca da filha mais nova, que era a mais bonita e amável de seus filhos. Outro conto que lembra a história de Cupido e Psiquê, mas ao invés de irmãs invejosas, é uma mãe preocupada que dá o conselho que acaba atrapalhando o relacionamento da garota e do príncipe. Também lembra bastante o conto O príncipe papagaio, pois a protagonista pergunta para várias pessoas onde fica o local em que o príncipe está e delas, ganha presentes que lhe serão úteis depois.

Peer Gynt – Escrito por Clara Stroebe. Peer Gynt era um grande caçador. Numa de suas voltas para casa, ele esbarrou em algo frio, escorregadio e grande. Quando perguntou quem era, este respondeu que era o Corcunda. Um conto estranho. Parece uma pequena coletânea de histórias sobre o protagonista enfrentando trolls.

Por que o Mar é Salgado – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Havia dois irmãos: um rico e um pobre. No Natal, o pobre foi pedir para o rico algo o que comer. Cansado do irmão viver lhe pedindo coisas, rico ia dar com a condição de o irmão fazer o que ele pedir. O pobre aceitou e o rico lhe deu um toucinho e o mandou ir para o Inferno. Chegando lá, o pobre encontrou um velho, que falou que muitos por lá iriam querer negociar o toucinho por algo, mas que o dono só deveria aceitar se oferecesse um moinho... Uma história que responde de maneira fantasiosa o porquê do mar ser salgado. E, como é de se esperar de um conto de fadas, o rico sempre se dá mal no final enquanto o pobre prospera.

A Noiva da Floresta – Escrito por Parker Fillmore. Já tendo idade para se casarem, os três filhos de um fazendeiro saíram em busca de suas noivas conforme a árvore que cortaram havia caído. A árvore de Veikko, o mais novo, apontou em direção à floresta, onde só havia animais. Mesmo assim, ele foi andando pelo mato e encontrou uma cabana com uma ratinha penteando seus bigodes... Conto com a mesma premissa do conto russo A princesa sapo* e de sua variante brasileira, A princesa sapa**, em que o irmão mais novo fica com uma noiva animal, e apesar de sua aparência, prova que é a melhor opção e se torna uma bela princesa no final.

Kari Capa Dura – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Um rei vivia com sua esposa e sua filha, até que um dia, sua esposa faleceu, deixando-o triste e solitário. Depois de um tempo, ele se casou com uma rainha viúva que também tinha uma filha tão feia quanto a sua era bela. Ela e a mãe odiavam a princesa, porém, não podiam fazer nada enquanto o rei estivesse por perto. Mas quando ele foi para a guerra, elas aproveitaram e maltrataram a pobre princesa, deixando-a passar fome. Quando a princesa foi cuidar do rebanho, toda chorosa, um touro baio, que a moça sempre acariciava, veio tranquilizá-la,  dizendo que em sua orelha esquerda havia uma toalha que ao puxar e abrir, poderia dar tudo o que ela quisesse comer... Este conto é descrito no livro como uma versão da Cinderela, especificamente a versão dos Grimm pelo corte do dedão e do calcanhar da irmã postiça para caber o sapatinho. Mas sua estrutura lembra O sargento de pau***, trocando os bailes por idas na igreja. E este último, tem similaridade com Pele de Asno. Uma mistura de histórias num só conto.

A Criança Trocada – Escrito por Selma Lagerlof. Uma mãe troll andava com seu bebê, que para ela era a coisa mais linda do mundo. Até que chegou numa estrada e viu um casal andando a cavalo com um bebê no colo. A troll acabou assustando os cavalos sem querer e a mulher deixou cair seu filho no arbusto. Vendo que o bebê humano era mais belo que o seu, a troll o pegou e deixou o seu filho no lugar. Um conto que mostra que a bondade pode te recompensar. Há uma hipótese de que a lenda da criança que é trocada por um ser mágico está associada com crianças que nasceram com alguma deficiência e que erroneamente, eram mortas. Aqui, a mãe humana faz de tudo para manter o bebê troll vivo, mesmo o marido e os empregados o odiando e ela própria tendo ressentimento e desejando em certos momentos se livrar do que é considerado um peso em sua vida. Acredito que pais de crianças especiais possam se identificar um pouco com ela. Escrevi um conto relacionado a esta lenda no livro A Pena Mágica e outros contos.

O Rei Dragão – Escrito por Svend Grundtvig. Um rei e uma rainha não conseguiam ter filhos. Até que uma velha disse à rainha que ela conseguiria ter filhos se colocasse um prato no chão, virado para baixo, no canto noroeste do jardim. No dia seguinte teria duas rosas. Se ela comesse a branca, seria uma menina e se comesse a vermelha seria um menino. A rainha fez o que foi dito e comeu a rosa branca. Mas não resistiu e comeu também a vermelha. Quando o bebê nasceu, viram que ele não era humano, e sim um dragão... Tinha visto uma versão bem parecida chamada Príncipe Lindworm. Está aqui possui uma segunda parte após o encantamento ser desfeito que acho desnecessária.

O Castelo de Soria Moria – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Halvor nasceu em uma família pobre e não se empenhava em aprender nenhuma profissão. Só tateava as cinzas do fogão. Até que um dia, um capitão o chamou para viajar com ele e Halvor aceitou. Após uma tempestade, eles perderam o seu rumo e foram levados a um estranho litoral. Halvor pediu para descer e caminhou até encontrar um castelo... Este conto é uma mistura de outros. Aqui, aparece três trolls com números de cabeça sendo múltiplos de três como em Kari Capa Dura e o protagonista perde sua amada e tem que partir numa viagem, perguntando para outros onde fica a sua residência, como em A Leste do Sol e Oeste da Lua.

A Giganta e o Barco de Granito – Escrito por Angus W. Hall. Sigurd foi para outro reino, se casou com Helga, a bela e tiveram um filho. Três anos depois, Sigurd recebeu a notícia que seu pai havia falecido e foi até seu país com sua esposa e filho no navio. Mas durante a viagem, enquanto dormia, sua esposa estava no convés com o bebê. E então, apareceu uma giganta vinda de um barco de granito, que a forçou trocar de lugar com ela. Não tenho muito o que dizer desse conto. Apenas que a esperteza de Helga e os ouvidos de dois príncipes salvaram o dia.  

O Gato em Dovrefjell – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Um homem havia capturado um urso-polar para levar ao rei da Dinamarca. No caminho, ele pediu abrigo a um homem chamado Halvor na véspera do Natal. Halvor disse que não poderia dar pois trolls vinham em toda véspera de Natal e atacavam todos da região. Mas o homem insistiu tanto que Halvor cedeu. Este conto é uma versão de uma das aventuras de Peer Gynt.

Poderoso Mikko – Escrito por Parker Fillmore. Mikko era um jovem pobre que havia perdido a mãe e o pai logo depois. Mas antes de partir, o pai deixou para ele três armadilhas e disse que se encontrasse um animal, o libertasse e o levasse para casa. Mikko encontrou um raposo na terceira armadilha, levou-o para casa e o tratou bem. O raposo perguntou por que estava triste e o moço respondeu que se sentia solitário. O animal então disse que o faria se casar com uma princesa. Uma versão do Gato de Botas.

Rei Valemon, o Urso Branco – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Um rei tinha três filhas, cuja mais nova era a mais bela e agradável enquanto as outras eram feias e más. A mais nova sonhou com uma bela grinalda de ouro e ficou triste por não a ter. Seu pai chamou os melhores ourives para fazer várias grinaldas, mas a princesa recusou todas. Um dia, brincando com um Urso Polar, viu que ele possuía a grinalda de seus sonhos. Em troca da grinalda, o urso quis ter a jovem como noiva. Ela aceitou, mas seu pai não deixaria que o urso a levasse. Conto muito similar A Leste do Sol e Oeste da Lua. Apesar de ser descrita como a mais agradável, achei a princesa bem mimada nesse começo. Outra história em que o mais novo é o mais belo e o favorito dos pais.

A Flor da Islândia – Escrito por Marie Jeserich Timme. Marietta, nascida na Itália, se casou com um marinheiro da Islândia e teve que abandonar sua terra quente e florida pelo gélido país do marido. Juntos, tiveram uma filha chamada Helga, que tinha a pele branca e cabelos loiros do pai e os olhos escuros e misteriosos da mãe. Por sua beleza rara, a apelidaram de flor da Islândia. Apesar de ter ser casado e ido para o local de nascença do marido, Marietta não pôde resistir às saudades de sua terra natal e acabou morrendo. Mas não antes de contar a filha sobre a Itália e deixar a menina com o sonho de conhecer este país. Anos se passaram e seu pai e primo foram viajar de barco, negando-a a possibilidade de ir com eles. Helga chorou e seu choro foi ouvido por alguém que a levou para uma terra ainda melhor que a da mãe: a terra das fadas. Um conto triste. A história quer que o leitor se simpatize com o amor de Helga e o rei das fadas, mas para mim, ele foi tão manipulador quanto o pai em querer deixá-la presa num só lugar.

Lindaura e o Velho Rei – Escrito por Anna Wahlenberg. O velho rei era um bom governante, mas desde que perdera a esposa e o filho, não deixava que ninguém se aproximasse dele, vendo garras nas mãos das pessoas. Um dia, ele estava caminhando na floresta, até que uma garotinha se agarrou nele, gritando que um monstro estava atrás dela... Um conto que mostra como a alegria de uma criança pode ser contagiante.

Lasse, meu vassalo – Escrito por G. Djurklou. Um nobre gastou toda sua fortuna e ficou miserável. Andando pela floresta, encontrou uma cabana. Entrando nela, viu um baú e dentro dele, havia outro baú. Depois de abrir vários baús, achou um papel no último deles, escrito “Lasse, meu vassalo!” Ao ler estas palavras em voz alta, alguém lhe respondeu, perguntando o que o seu mestre ordena... Tudo que se ganha com facilidade, também pode se perder com facilidade. O esforço pode recompensar.

O Anel – Escrito por Helena Nyblom. Ao retornar de sua cavalgada noturna, o príncipe deu uma passada na praia e encontrou um pequeno anel, de pedrinhas azuis que formavam uma flor não-me-esqueças. Achando que fosse de uma dama do palácio, perguntou se alguma delas havia perdido um anel, mas nenhuma delas tinha perdido. Ao deixar o anel numa mesa próxima à sua cama e apagar as luzes, a joia começou a girar. Se movia todas as noites, a ponto de incomodar o príncipe, que por fim, decidiu embarcar numa jornada em busca de sua dona. Conto bonitinho.

Noiva Galhuda – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Um viúvo tinha dois filhos: um menino e uma menina. Ele se casou com uma mulher que também era viúva e possuía uma filha. A nova esposa e irmã era tão ruins com os filhos dele que o rapaz saiu para cuidar dos cavalos do rei e para ficar bem longe delas. A irmã não teve essa sorte, sendo maltratada e feita de empregada pelas duas. Ao ir pegar água, uma cabeça gigante pediu para que a limpasse. Uma segunda pediu que penteasse o seu cabelo e uma terceira pediu que a beijasse. Tendo atendido todos os seus pedidos, as cabeças decidiram recompensá-la... Parece uma mistura do conto russo Morozko, o velho inverno**** e o conto A Giganta e o Barco de Granito.

O Homem de Neve – Escrito por Hans Christian Andersen. O Homem de Neve conversava com o cachorro que ficava no quintal. Em suas conversas, o animal mencionou o fogão. Ao ver o fogão pela janela, o Homem de Neve sentiu algo estranho dentro de si. História melancólica. O final é, em grande parte, previsível, mas tem um pequeno detalhe que surpreende.

Heiemo e Nokk – Escritor anônimo. Um nokk mandou um capitão ir para a terra dos cristãos, pois ia desposar a bela virgem, Heiemo. Este texto é uma tradução de uma canção clássica da Noruega e este nokk, pelo que pesquisei, faz parte de mitologia nórdica e é um espírito aquático que atrai pessoas para a água e então as afoga. Normalmente, ele aparece na forma de um homem, de uma mulher bonita ou de um cavalo. Esta última me lembrou o mito do kelpie.

A Saga do Alce Skutt e da Princesa Tuvstarr – Escrito por Helge Kjellin. No Castelo do Sonho, vivia uma princesinha chamada Tuvstarr. Ela encontra um alce chamado Pernalonga Skutt e pediu para este a carregasse vida afora. Ele avisa que o mundo é cruel lá fora, mas a menina insiste e o alce acaba a levando. O mundo é realmente cruel e precisa ter cuidado com tudo. Principalmente numa floresta mágica. Conto melancólico.

Pernacurta e os Trolls – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Um casal muito pobre quase não tinha o que comer e ainda tinha um filho a cada ano. O pai reclamou tanto disso que quando o seu filho nasceu, este pediu para que sua mãe lhe desse roupas velhas e comida que ele iria embora. O seu gêmeo fez a mesma coisa e foi encontrar o mais velho. Os dois se deram o nome de Rei Robusto e Pernacurta respectivamente e depois de um tempo, se separaram, com Rei Robusto prometendo vir salvar sua vida se chamasse o seu nome três vezes. Outra história envolvendo trolls de várias cabeças e situações envolvendo o número três. Conto legalzinho.

O Monte Élfico – Escrito por Hans Christian Andersen. O velho rei dos elfos planejava fazer uma festa no monte élfico, convidando vários tipos de seres sobrenaturais. O convidado mais esperado era o Velho Duende da Noruega, vindo das antigas montanhas de Dovre. O duende foi com a intenção de encontrar noivas para seus dois filhos, mas estes eram bastante mal-educados... Um conto que não possui uma aventura ou algo muito espetacular. Meio sem graça.

O Vizinho Subterrâneo – Escrito por Peter Christen Asbjornsen e Jorgen Moe. Um camponês teve má sorte com seu gado e perdeu sua propriedade. Acabou comprando outro pedaço de terra próximo a uma floresta até que encontrou um homem, que descobriu que além de ser seu vizinho, era uma pessoa do povo subterrâneo. Mas não se importou e o convidou para cear em sua casa. O vizinho foi e disse que ele precisava mudar o estábulo de lugar senão haveria consequências... Gentileza gera gentileza.

Tempestade Mágica – Escrito por Clara Stroebe. Um jovem camareiro tinha em sua posse um trevo de quatro folhas, que o permitia ver seres que eram invisíveis sem que estes seres o pudessem ver. Então, dentro do navio, ele acabou ouvindo a conversa de três bruxas transformadas em corvos. Elas eram as esposas do capitão e dos dois intendentes e planejavam matar seus maridos junto com toda a tripulação. É um tanto estúpido você planejar um assassinato de alguém no local onde ocorrerá o massacre, e ainda por cima revelar o contrafeitiço que pode estragar o seu plano. Vilões podem ser estúpidos às vezes.

A Última Morada dos Gigantes – Escrito por Marie Jeserich Timme. Num castelo que antigamente pertencia a gigantes, o atual dono se chama Samund, que tem uma bela filha chamada Aslog. Ele deseja que a moça se case com algum homem nobre, mas o coração da jovem pertence a Orm, um pobre pajem. Por negar todos os pretendentes, o pai a obrigou que escolhesse um noivo antes da noite de Natal. Então, uma noite antes da data, Aslog foge com Orm. Porém, essa fuga trará consequências. O perdão é uma dádiva. Apesar ser um dos contos cristãos que mostra como perdoar faz bem, não vi o cristianismo tão glorificado como nos outros contos, pois não esconde totalmente o que ele fez com os pagãos, que aqui é demonstrado figurativamente na forma de gigantes e anões.

            Estou tão acostumada com a mitologia nórdica que esperava alguma menção de Thor, Odin ou Loki em um desses contos. Mas apenas o último fez menção a Odin como um rei que invadiu um castelo de gigantes pacíficos para acrescentar ao seu território, matando-os enquanto estavam dormindo. Com exceção de um casal que fugiu. E é dito que apesar do sangue derramado, ele governou com “sabedoria, poder e benevolência”. Em nenhuma vez, Odin é mencionado como um deus. Muito provável que isso tenha acontecido devido a introdução do cristianismo na região nórdica.

 Muitos desses contos mencionam o cristianismo como algo bom e trolls, que são considerados criaturas malignas, odeiam os cristãos. Eles os aprisionam ou querem devorá-los. Aparentemente, a religião já tinha se estabelecido como dominante quando estas histórias foram coletadas. Além dos trolls, gigantes, elfos e alguns outros seres do folclore nórdico são mencionados em alguns desses textos.

            Tive uma boa experiência literária. Recomendo a leitura para quem é fã de contos de fadas e deseja conhecer um pouco mais das histórias nórdicas. Mas se você for cristão, tenha cuidado. Os trolls podem sentir o seu cheiro...

 

 

* Resenha do conto A princesa sapo: Ponte para o Imaginário: Contos de fadas russos

**Resenha do conto A princesa sapa: Ponte para o Imaginário: Lendas e Fábulas do Brasil

***Resenha do conto O sargento de pau: Ponte para o Imaginário: Lendas e Fábulas do Brasil

****Resenha do conto Morozko, o velho inverno: Ponte para o Imaginário: Contos de fadas russos

 

 

 


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