terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Ebabitnebi

         
          
          Começarei o blog apresentando o meu primeiro conto publicado no livro 164 – circular pela editora Texto Território. Nele são apresentados vários contos feitos por alunos da PUC-Rio da aula de Oficina de Texto Editorial do ano de 2015. A princípio, iríamos aprender como revisar originais e preparar textos que compõem um livro, fazendo a orelha, a quarta capa etc. No final fizemos nosso próprio livro. Foram aulas bem produtivas.

Ebabitnebi


Era uma manhã comum, meu pai estava me levando para a escola em seu carro. Enquanto ele dirigia, eu ficava no banco de trás olhando para a paisagem. Fiquei observando até que avistei um carro igualzinho ao nosso. Não era raro encontrar um Classic nas ruas, mas o que eu achei estranho foi que era a mesma cor dourada e tinha um arranhão na porta traseira do carro que nem o dele, só que ao invés de ser na direita era na esquerda.
O motorista era uma mulher de cabelo curto e negro. Pude notar esses detalhes por causa do trânsito que estava lento, o que era incomum, pois a essa hora da manhã não costumava ser assim, não estava chovendo nem nada. Meu pai ligou o rádio, mas ele não deu notícia de nenhum acidente naquele bairro. Pedi para meu pai colocar um CD e, enquanto estava fazendo o que pedi, olhei para a minha direita e vi que a mulher fazia o mesmo.
Achei uma grande coincidência. Quando olhei para a janela de trás do carro vi que havia um menino. Ele estava usando o mesmo uniforme que eu e parecia ter a mesma idade que a minha. “Deve ser da outra sala”- pensei. Comecei a olhar mais para ele. Tinha cabelos negros, sobrancelhas grossas que nem a mãe dele. Supus que a motorista fosse a mãe dele pela aparência, a única diferença era que ele tinha uma pele mais branca que nem a minha. Pele branca que nem a minha! “Espere um pouco”- pensei. Não era só a pele branca, eram os olhos, as sobrancelhas, a cor do cabelo e a expressão do rosto. Ele era idêntico a mim, a única diferença era que ele era menino.
De repente, o carro parou. Meu pai desceu do carro e me pediu para fazer o mesmo. E o fiz, enquanto ao lado, a mulher e o menino faziam o mesmo. Meu pai disse que o carro estava com algum problema e falou que enquanto ele resolvia para eu ir conversando com o menino ao lado. Fui até o garoto e perguntei o seu nome e ele respondeu, mas não entendi o que ele disse. Pedi para ele repetir e ele repetiu. Continuei sem entender nada, o que me deixou angustiada, pois eu vi que o meu pai e a mulher estavam conversando naturalmente, mesmo que ela esteja falando algo completamente incompreensível.
“Acho que estou ficando louca.”- pensei. O garoto continuou falando de uma maneira que eu não conseguia entender. Como eu devia ter feito uma cara de boba quando ele falou, ele tirou da sua mochila um caderno e um lápis e escreveu:
ÊCOV UOS.
Quando li, achei que estava em outra língua, mas então percebi que não me era estranho. Peguei o pequeno espelho de dentro da minha mochila e coloquei ao lado de seu caderno. Então li:
- Sou você.
Do nada o mundo ficou distorcido, e o cabelo do menino parecia estar crescendo. Fiquei tonta. Decidi fechar os olhos para ver se a tontura passava. Quando abri, estava no banheiro da minha casa. E ao invés de estar o menino na minha frente, estava o enorme espelho e o meu reflexo olhando para mim.  Cabelos negros, sobrancelhas grossas.

14 comentários:

  1. Ah, que lindo esse conto! E como você escreve bem. É daqueles textos que entretém a atenção de uma maneira tão natural, agradável, sabe? Com aquele gostinho que quero mais! :) Seus pais já tinham me dito que você escrevia muito bem. E comprovei agora que eles têm razão. Parabéns, Mariana!

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    1. Muito obrigada :) Suas palavras me deixaram bem feliz e são um estímulo para eu continuar. Em breve, novidades. Abraço.

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  2. A sexualidade e o espelho não são realmente complementares... Por isso a distorção e a angústia... Fortes são seu cabelo escuro e sobrancelhas grossas que tornam o texto igualmente forte! Beijinho!

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